as páginas

lift,
bringen sie mir einen kaffee
ende der welt

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Arthur Rimbaud

Cocheiro Bêbado


Alacre
Vai:
Nacre
Rei.

Acre
Lei.
Fiacre
Cai!

Dama:
Tombo
Lombo

Dói.
Clama:
Ai!


Tradução de Augusto de Campos

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Gustavo Dourado

Cordel para Guimarães Rosa


No Grã Ser: tão: Veredas
Presença do Pentagrama
Terceira Margem do Rio
Romance, Poesia e Drama
Riobaldo- Diadorim...
Bi coto mia na trama ...

Coragem, amor, oração
Délivrance e destemor
Não é nada e é tudo...
Árdua epo.peia da dor
Atravessia do destino:
Vida e morte mais amor...

Indecisão e coragem
Medo e determinação
Anagrama: Alchemia
Processo de Iniciação
De Barbazu a Siruiz
Presente de Seô Habão...

São Francisco Urucuia
Trilhas do Grande Sertão
A Canção de Siruiz
Mexe com meu coração
Realidade fantaseia
Sonhos e caosmovisão...

Joca Ramiro Zé Bebelo
Hermógenes e Ricardão
Medeiro Vaz jagunceia
Garimpa veias do Sertão
TetragrammAton: Osiris
E o Signo de Salomão...

Siruiz bem gateado
Cavalga fenomenal
Galopeia pela vida
Com ares de maioral
Cavalo bom é difícil:
É cavalo magistral...

Conquista existencialma
Rio Baldio no Caminho
Redenção...Conhecimento
Luz alquímica do vinho
Renascimento Travessia
Encontro do eu sozinho...

Osiris enfrentou a Morte
No Hades esteve Orfeu
Riobaldo em seu cavalo
No cosmos de Prometeu
Odisséias pelos mundos
De Pã...Ulisses...Teseu...

Medeiros Vaz quer Justiça
Joca Ramiro: Amizade
Zé Bebelo na Política
Do Sertão para a cidade
A vida é um rio baldo
Que impõe dificuldade...

Diadorim é fascínio
Mistério dual idade
Dia-dor-(z)-im(ha) é luz
Símbolo de afetividade
Dia dóron Travessoa
Veredas da Eternidade...

Rosa travessia o tempo
Nos buritis da mensagem
Nos papiros da saudade
Fez um Magma na linguagem.
Transmutador das veredas:
Além da Terceira Margem.


Gustavo Dourado

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Liana Timm


Lição de Casa



Escrevo para ti

com esse mau gosto

e essa ausência de medidas

mais para incitar o sexo

Reitero hoje o que disse nunca

sobre a malícia

e descubro meu escândalo

perdido em viadutos

Em férias a paixão interditada


segunda-feira, 23 de novembro de 2009

JG de Araújo Jorge

Paradoxo

A dor que abate, e punge, e nos tortura,
que julgamos às vezes não ter cura
e o destino nos deu e nos impôs,
é pequenina, é bem menor, e até
já não é dor talvez, dor já não é
dividida por dois.

A alegria que às vezes num segundo
nos dá desejos de abraçar o mundo,
e nos põe tristes, sem querer, depois,
aumenta, cresce, e bem maior se faz,
já não é alegria, é muito mais
dividida por dois.

Estranha essa aritmética da vida,
nem parece ciência, parece arte;
compreendo a dor menor, se dividida,
não entendo é aumentar nossa alegria
se essa mesma alegria
se reparte.


quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Fred Matos


Allegro


as cordas do meu violão
tocam um só
sonolento acorde
só acordam
quando me acode
a lembrança do teu beijo

então elas toam desejos
numa melodia fantástica
que percorre toda a escala
em seqüência erótica
orgástica

ouço o timbre do piano
ouço a flauta de Atena
ouço a lira de Apolo
é perfeita a harmonia

a orquestra toca teu nome
no allegro da sinfonia.


terça-feira, 10 de novembro de 2009

Li T’ai Po (Rihaku)


Improviso


Nuvens

são

cambraias

Pétalas

tuas

faces

Brisa

que farfalha

nas varandas

altas

Cristaliza

orvalho

diamantes

de água

Se não posso

vê-la

nos píncaros

de jade

Sob a lua

ei-la

no pavilhão

de jaspe


tradução: Haroldo de Campos

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

poema chinês

Poema chinês compilado por Confúcio:

Ode 93

moça como nuvem
na porta este
como nuvem e este
coração resiste

lenço de seda cinza
veste de seda simples
só ela para mim
(tambor e címbalos!)
existe

moças como junco
no portão de ameias
como junco e junto
o coração desdenha

pano de cor garança
veste de seda branca
só ela me deixa
(vermelho garança)
tremor de beleza


Tradução Haroldo de Campos

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Carlos Drummond de Andrade



As sem razões do amor



Eu te amo porque te amo.
Não precisas ser amante,
e nem sempre sabes sê-lo.
Eu te amo porque te amo.
Amor é estado de graça
e com amor não se paga.

Amor é dado de graça,
é semeado no vento,
na cachoeira, no elipse.
Amor foge a dicionários
e a regulamentos vários.

Eu te amo porque não amo
bastante ou demais a mim.
Porque amor não se troca,
não se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
feliz e forte em si mesmo.

Amor é primo da morte,
e da morte vencedor,
por mais que o matem (e matam)
a cada instante de amor.


Carlos Drummond de Andrade

domingo, 1 de novembro de 2009

Manuel Bandeira


Os sapos


Enfunando os papos,
Saem da penumbra,
Aos pulos, os sapos.
A luz os deslumbra.

Em ronco que aterra,
Berra o sapo-boi:
- "Meu pai foi à guerra!"
- "Não foi!" - "Foi!" - "Não foi!".

O sapo-tanoeiro,
Parnasiano aguado,
Diz: - "Meu cancioneiro
É bem martelado.

Vede como primo
Em comer os hiatos!
Que arte! E nunca rimo
Os termos cognatos.

O meu verso é bom
Frumento sem joio.
Faço rimas com
Consoantes de apoio.

Vai por cinquüenta anos
Que lhes dei a norma:
Reduzi sem danos
A fôrmas a forma.

Clame a saparia
Em críticas céticas:
Não há mais poesia,
Mas há artes poéticas..."

Urra o sapo-boi:
- "Meu pai foi rei!"- "Foi!"
- "Não foi!" - "Foi!" - "Não foi!".

Brada em um assomo
O sapo-tanoeiro:
- A grande arte é como
Lavor de joalheiro.

Ou bem de estatuário.
Tudo quanto é belo,
Tudo quanto é vário,
Canta no martelo".

Outros, sapos-pipas
(Um mal em si cabe),
Falam pelas tripas,
- "Sei!" - "Não sabe!" - "Sabe!".

Longe dessa grita,
Lá onde mais densa
A noite infinita
Veste a sombra imensa;

Lá, fugido ao mundo,
Sem glória, sem fé,
No perau profundo
E solitário, é

Que soluças tu,
Transido de frio,
Sapo-cururu
Da beira do rio...


Manuel Bandeira
em "Estrela da Vida Inteira"

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Fred Matos



Se eu fosse um anjo



Tivesse asas, fosse um anjo,
poderia cingir-te aos braços
sem a volúpia que me inflama
e não roubaria os beijos
da boca que não me ama.

Poderia, talvez pudesse,
serenar-te o ânimo,
murmurando velhas fábulas
de amizades inumanas:
tivesse asas, fosse um anjo.

Poderia, talvez pudesse,
levar-te às estrelas,
onde se pode entender
a insignificância de tudo:
tivesse asas, fosse um anjo.

Mas não sou um anjo.
pulsam em mim as paixões
que movem a espécie humana
e o meu desejo é maior
que a razão que a hora clama.

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Marco Aurélio Pais

Techné


Por mim, me imponho, sim, essa gramática
De sílabas contar fazer rimas,
Me dou por desafio à disciplina
Por minha progressão autodidática
Eu sei que só o difícil é que ensina
E não se opõem o visceral e o técnico,
Recuso-me ao prosaico e ao hermético
E aos versos de diário de menina
Um tanto culinário, um tanto atlético,
Busco juntar razão e sentimento
E dar forma de canto ao meu lamento
Para ser livre em todo molde métrico.

Não limo jóias finas de senhora
Nem faço versos só como quem chora.

domingo, 25 de outubro de 2009

Paulo Mendes Campos


relógio de sol



De todas as minhas façanhas
a que me dói mais lentamente
é sentir nas minhas entranhas
o meu coração arbitrário
girando em sentido contrário
à parábola do poente.

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

compensação


os bons momentos compensaram
as cicatrizes que deixastes
mas não as contas vencidas
o telefone mudo
a energia cortada
as crianças sem escola
euzinha sem cirurgia plástica

seus apelos não me comovem
já contratei advogado
pra pedir tua prisão
homem pode ser sacana
mas eu não fico na mão
por mim mofas na masmorra
com a boca cheia de porra

du

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

recado

a música me leva
e eu não percebo
o balanço do corpo
a lua cheia tatuada
o pingente de cristal
as rosas vermelhas
o cálice sobre a mesa
o perfume de jasmim

deixaste a luz acesa
estou morto de sono
a cama está desfeita
é tarde e não te acho
só um bilhete no espelho
um gato sobre o telhado

estou muito cansado
amanhã faço um poema


du

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

imagem





deixe-me brincar com as tuas mãos
ponha a destra no meu sexo
a outra no meu cabelo

se fores minha imagem no espelho
e a realidade perdeu o nexo
meus olhos são onde os teus estão


du

terça-feira, 20 de outubro de 2009

proposta

quando nos separamos
não nos dissemos adeus
e deixaste-me convicto
que teus olhos eram meus

por serem meus os teus olhos
foi com eles que enxerguei
que os meus joelhos tremiam
no dia em que te me entreguei

e quando partistes sorrindo
levaste contigo meus sonhos
deixando comigo a ilusão
da loucura que te proponho:

atire-te do mais alto penhasco
que te apararei nos meus braços


du

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

identidade

eu tinha um sonho
mas era tarde
e descobri
que sou covarde

em todo caso
mas sem alarde
vesti uma nova
identidade

pus o meu sonho
no teu sorriso
abandonou-me
ficou contigo

uma esperança
ainda me resta
que vindo a morte
seja uma festa

du

Vladimir Maiakóvski

A FLAUTA VÉRTEBRA

A todos vocês,
que eu amei e que eu amo,
ícones guardados num coração-caverna,
como quem num banquete ergue a taça e celebra,
repleto de versos levanto meu crânio.

Penso, mais de uma vez:
seria melhor talvez
pôr-me o ponto final de um balaço.
Em todo caso
eu
hoje vou dar meu concerto de adeus.

Memória!
Convoca aos salões do cérebro
um renque inumerável de amadas.
Verte o riso de pupila em pupila,
veste a noite de núpcias passadas.
De corpo a corpo verta a alegria.
esta noite ficará na História.
Hoje executarei meus versos
na flauta de minhas próprias vértebras.


tradução: Haroldo de Campos e Boris Schnaiderman

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Charles Baudelaire

Spleen e Ideal
II - O Albatroz


Às vezes, por folgar, os homens da equipagem
Pegam de um albatroz, enorme ave do mar,
Que segue - companheiro indolente de viagem -
O navio no abismo amargo a deslizar.

E por sobre o convés, mal estendido apenas,
O imperador do azul, canhestro e envergonhado,
Asas que enchem de dó, grandes e de alvas penas,
Eis que deixa arrastar como remos ao lado.

O alado viajor tomba como num limbo!
Hoje é cômico e feio, ontem tanto agradava!
Um ao seu bico leva o irritante cachimbo,
Outro imita a coxear o enfermo que voava!

O Poeta é semelhante ao príncipe do céu
Que do arqueiro se ri e da tormenta no ar;
Exilado na terra e em meio do escarcéu,
As asas de gigante impedem-no de andar.


Charles Baudelaire
Em: As Flores do Mal
Tradução: Jamil Almansur Haddad.

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Fernando Pessoa

Prece


Senhor, a noite veio e a alma é vil.
Tanta foi a tormenta e a vontade!
Restam-nos hoje, no silêncio hostil,
O mar universal e a saudade.

Mas a chama, que a vida em nós criou,
Se ainda há vida ainda não é finda.
O frio morto em cinzas a ocultou:
A mão do vento pode erguê-la ainda.

Dá o sopro, a aragem — ou desgraça ou ânsia —
Com que a chama do esforço se remoça,
E outra vez conquistaremos a Distância —
Do mar ou outra, mas que seja nossa!